Como o PS preparou a privatização do ensino - blog 5 dias

por Ricardo Santos Pinto



Primeiro, privatizaram alguns serviços das escolas, como as cantinas, concessionadas a privados. É o que temos hoje na maioria dos estabelecimentos de ensino público: comida de pior qualidade (na minha escola, dizem os alunos, come-se arroz com arroz, porque às vezes a carne ou o peixe não chega para todos ou chega aos seus pratos intragável), gastos maiores para o Estado e um reduto privado dentro da própria escola que, no fundo, não é público. Chega-se ao absurdo de ver a escola a pagar o aluguer da cantina se quiser organizar aí um convívio de professores ou de alunos. Isto se a empresa autorizar, claro.


Forma hábil, também, de reduzir drasticamente a probabilidade de existirem greves e consequente encerramento das escolas. Em tempos, bastava que as cozinheiras fizessem greve para que a escola fechasse. Com privados, a cantiga é sempre outra.
Depois veio a entrega do ensino básico de 1.º ciclo aos municípios, que muitas vezes gerem o seu parque escolar através de empresas municipais facilmente privatizáveis. Não é difícil imaginar que, nas mãos de um município, uma escola perde a sua autonomia administrativa e pedagógica. Mesmo nas restantes escolas básicas e secundárias, os famigerados Agrupamentos e Mega-Agrupamentos, hoje em dia são os municípios que, na prática, escolhem o Director. Fecharam-se escolas a torto e a direito nas aldeias, mas em seu lugar criaram-se centros escolares, muitas delas em centros urbanos e em locais muito apetecíveis para os privados. E todos conhecemos o apetite devorador das Câmaras pelo sector urbanístico.
Ainda dentro do 1.º ciclo, a criação das AEC’s – Actividades Extra-Curriculares foi porventura o exemplo mais às claras de privatização do ensino. Actividades entregues sem disfarce a empresas privadas, que por sua vez passaram a contratar os professores. Aqui, a exploração foi sempre a palavra de ordem. Abundam os casos em que estes professores, muitas das vezes a recibo verde, recebem 4 euros por hora e, para além das aulas, ainda têm de acompanhar os meninos durante o intervalo. Uma situação que foi piorando à medida que o programa se foi implementando. Na Câmara do Porto, por exemplo, começou por ser a Faculdade de Letras a contratar os professores de Inglês das AEC’s, mas dois anos depois já era uma empresa privada de Lisboa a tratar do assunto, pagando, como é óbvio, muito menos. Em 2009/2010, numa medida com o mais elevado sentido pedagógico, os docentes receberam os seus horários para o ano lectivo numa garagem de Matosinhos.


A cereja no topo do bolo chamou-se Parque Escolar. A pretexto de modernizar as escolas – algumas precisavam, outras não – entregou-se a uma empresa pública o planeamento, a gestão, o desenvolvimento e a execução das obras, na maior parte das vezes através de ajustes directos e sem a menor transparência, como o Tiago Mota Saraiva tantas vezes denunciou no 5 Dias. Uma empresa pública que, repare-se, tornou-se a proprietária das escolas que intervencionou, sendo que estas passaram a pagar verdadeiros balúrdios de renda mensal à Parque Escolar. E se esta um dia for privatizada (será uma das duas grandes empresas que Sócrates queria privatizar em 2012?), todas essas escolas passam a ser privadas. Simples, não é?


Num assomo de honestidade, em fim de festa, os nossos amigos corporativos acabam por reconhecer que os Governos de Sócrates não pararam de aumentar o financiamento do ensino privado, apesar da diminuição do número de turmas subsidiadas.
Depois disto tudo, é provável que os socialistas tenham a suprema lata de vir dizer que o PSD quer privatizar o ensino. E logo eles que não fizeram nada para isso…

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