Sexta-Feira 13



Nesta sexta-feira dia 13 de Março de 2009 pensei que seria uma experiência interessante registar o que me acontece num dia ou numa semana de trabalho típica. Devo dizer que a minha profissão é a de professor, pelo que, nos tempos que correm, sou um alvo a abater. Adiante.

Nesta sexta-feira, as principais ocorrências de carácter disciplinar (que é como se chama modernamente à má educação, marginalidade e brutalidade), foram as seguintes:

- 8.00 horas - O aluno Raimundo da turma especial do 6º ano espancou o aluno Eduardo, da minha Direcção de Turma, a 2 metros do portão da escola. Sem qualquer motivo. Apeteceu-lhe.

- 12.30 horas - O aluno Raimundo da turma especial do 6º ano, na cantina da escola, entornou alguma água no seu tabuleiro, e exigiu que o aluno Hermínio, da minha Direcção de Turma, limpasse a água com um guardanapo. Como este se tivesse negado, regou-lhe a comida toda com o conteúdo inteiro de uma garrafa de litro e meio de água. A comida ficou impossível de ser consumida, pelo que o almoço do aluno foi meio papo-seco oferecido por outro aluno.


- 14.30 horas - Tive conhecimento do sucedido, redigi as participações disciplinares e procurei o aluno Raimundo, que tem 17 anos, anda no 6º ano, mede 1.80m e desde que entra até que sai da escola tudo o que faz é agredir, insultar, ameaçar e destruir.

Perguntei-lhe o que se tinha passado.

Respondeu-me:


"Bati no Eduardo do portão para fora, por isso você não tem nada a ver com isso, e aquilo da água na comida do Hermínio é mentira".

Avisei-o para que não tocasse mais nos meus alunos. Riu-se e disse:

- "É só se não me apetecer".

Redigi nova participação disciplinar. Será mais uma para o monte. Inútil.

- 15.25 horas - Na fila para o bar, o aluno da minha Direcção de Turma Carlos Daniel, foi espancado por um aluno dos Cursos de Educação e Formação, de nome Fábio, sem qualquer motivo. Apenas por desfastio. Nova participação disciplinar, relatório, recado nas cadernetas, cópias para o Director de Turma do agressor, para o Conselho Executivo, para o meu dossier, cartas registadas.

- 16.00 horas - A minha aula é interrompida por uma gritaria enorme. Ouço uma mulher a chorar. Ao lado de um cacifo destruído, o aluno que agredira os meus dois, de manhã, ria-se na cara da funcionária, que entrara em desespero por ele estar a destruir o cacifo e não lhe obedecer. A funcionária chorava convulsivamente, na medida exacta em que ele a insultava, chamando-lhe um pouco de tudo o que se possa imaginar. Chamei o vice-presidente, que pediu ao aluno para o acompanhar. O Raimundo afirma peremptoriamente que não fez nada (!!!).

Chama-se mentiroso. Diz que me f*** os cornos à saída.

- 16.30 horas - O aluno Fábio (o da agressão ao Carlos Daniel) é expulso da sala de aula contígua. Recusa-se a sair. A professora pede ajuda e as funcionárias fogem. Naturalmente, acudo. O indivíduo, refastelado numa mesa e a rir-se às gargalhadas, galvaniza toda a turma numa espécie de delírio colectivo. É o caos. Peço licença à colega, pego nele e ponho-o na rua.

- Você tem a mania que é esperto, qualquer dia f***-se! Sempre a meter-se onde não é chamado!...

Mais uma participação disciplinar, com todo o cortejo de procedimentos burocráticos associados, e para nada.

Entrei às 8.15 horas. Às 17.30 acabou o meu período de aulas, com 50 minutos de almoço. Dei sete blocos de aulas, no meio de indisciplina, e todos os meus intervalos, mesmo o do almoço, foram ocupados a preencher papéis referentes a estes casos mais flagrantes de indisciplina. Não têm conta os palavrões que ouvi, as gritarias nos corredores, os insultos velados ou pelas costas de modo a não se identificar quem insultou, ou não se "ter provas".

É fácil de imaginar o estado de nervos em que se trabalha. A disposição, a clareza de raciocínio, a inspiração, tudo se dissolve debaixo desta contenção forçada, deste caos, desta selva sem lei a que se está sujeito. Todos os dias.

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