Horários, Ordenados e Carros Incendiados

Na notícia do Público acerca dos dois carros de professores que foram incendiados, boa parte dos comentários apontam não para o sinal de alarme que é ter incendiários dentro de uma escola, mas para o facto de um dos carros ser Mercedes!

Ora aqui está uma oportunidade para eu expor a minha situação laboral-financeira. O que se diz por aí é que os professores ganham 3 mil euros em início de carreira e que trabalham 6 horas por semana, que têm 3 meses de férias por ano, e provavelmente que comem crianças ao pequeno-almoço! Essa "informação" é passada a par com o lembrete discreto de que há quem ganhe 500 euros por mês. Pois há. A minha filha mais velha, por exemplo, é trabalhadora-estudante e ganha ainda menos!

Deve haver certamente algum complot contra mim, pois tenho 25 anos de serviço, sou licenciado e profissionalizado com boas notas, tive sempre boas avaliações, e ganho cerca de 1400 euros por mês.

Tenho no meu horário 24 horas de aulas por semana mais as que dedico à Direcção de Turma, ao clube, às reuniões, à preparação de aulas, à correcção de trabalhos, às acções de formação, à manutenção de páginas escolares na Internet para apoio aos alunos, às ajudas voluntárias na Biblioteca, Ludoteca e sala de Estudo, às tarefas burocráticas (como as de carácter disciplinar, conforme se pode verificar da minha experiência «Uma Semana de Indisciplina», que acabou hoje) e outras que seria fastidioso enumerar.

As minhas férias não são iguais às dos alunos. Para além de o meu horário de trabalho semanal ultrapassar generosamente as 35 horas previstas na Lei - e esta é uma profissão psicologicamente muito desgastante, como as de médico, polícia, mineiro ou enfermeiro - e de trabalhar sempre nos fins de semana, tenho 22 dias de férias em Agosto, e, se possível, a actividade não lectiva nas escolas abranda na semanas da Páscoa e do Natal. Ó criiiimeeee!!!

Tenho duas filhas a estudar. A minha Mulher é doente e não pode trabalhar. Não tenho automóvel. Não tenho recursos financeiros para tal. Fiz o meu curso superior como trabalhador-estudante e julgo não estar a cometer nenhum crime ao ter escolhido esta profissão. No entanto, caso os comentadores do Público desejem, posso dar-vos a minha bicicleta para incendiarem...

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